O Jogo da Amarelinha - Julio Cortázar



Recomendação de leitura por Vinicius Varela


O Rayuela, em português “O Jogo da Amarelinha”, de Julio Cortázar, é um acontecimento na história da literatura. Lançado em 1963, mudou a forma de se fazer romances. O romance nunca mais foi o mesmo depois disso. Uma obra essencialmente aberta que permite múltiplas leituras e mais do que permitir, deseja ser lida de diversas formas. Rayuela é um convite ao leitor a construir sua própria narrativa. O autor dá ao leitor fragmentos que podem ser organizados da maneira que o leitor desejar. Acontece um trabalho de co-autoria em que o livro é construído entre o escritor e o leitor. O livro não chega às mãos do leitor já pronto, pelo contrário, ao chegar a essas mãos é que começa a se construir, as partes soltas de juntando. Poderia dizer-se que Rayuela é um livro sobre livros. Inicialmente, Rayuela são dois livros em um só, mas como o próprio autor diz no ”Tablero de dirección”, um tabuleiro de instruções para a leitura: “A su manera este libro es muchos libros, pero sobre todo es dos livros. El lector queda invitado a elegir una de las dos posibilidades siguintes” ( À sua maneira este livro é muitos livros, porém, fundamentalmente, dois livros. O leitor está convidado a escolher uma das possibilidades a seguir – em tradução livre). Em seguida, o autor explica que o primeiro livro deve ser lido de maneira normal, até o capítulo 56, onde termina. Já o segundo, começa no capítulo 73 e segue uma ordem indicada no início de cada capítulo. Os capítulos desse segundo livro são lidos “puladinhos”, igual ao “jogo da amarelinha” em que se pula as casas até chegar à casa marcada pela pedrinha previamente arremessada. 73 – 1 – 2 – 116 – 3 – 84 – 4 – 71 – 81...(e assim sucessivamente). Desde o começo, o leitor é convidado a ler o livro da maneira que desejar. O autor deixa o leitor à vontade para explorar o livro. Da parte dele são propostas duas leituras, entretanto, o que Julio Cortázar deseja, sem dúvida, é a plurissignificação. Enquanto houver novas leituras, capazes de renovar a obra, o trabalho do autor se concretiza. Ele que foi o escritor belga mais argentino de todos e mais afrancesado também, estava propondo em suas criações uma mudança drástica na forma de se pensar e fazer literatura, mas ainda demoraríamos alguns anos em perceber. Os argentinos logo reclamariam o “argentinismo” de Cortázar, mas ele terminaria enterrado em Paris, tendo se naturalizado francês, em protesto à ditadura militar argentina. Em entrevista, o escritor disse que, apesar de ter vivido tempo suficiente em París como para mudar de língua e adotar o francês, jamais conseguiria deixar de escrever em espanhol. O espanhol era sua língua, uma língua que ele jamais poderia abandonar. Rayuela é um jogo literário dos mais interessantes em que em cada casa (capítulo) se esconde uma surpresa e no final do jogo não há prêmio. Não raro acontece entre os jogadores (leitores) se perguntar, ao final do jogo (leitura), o porquê de ter jogado. Parece que são tomados por uma espécie de amnésia literária, não conseguindo lembrar como começou aquele jogo (livro). O livro de Julio, O Jogo da Amarelinha, certamente interessará aos melhores ludomaníacos ou ludópatas para dizê-lo na língua do autor. Estão preparados para jogar o jogo? Jogue a pedrinha e descubra o que vem no próximo capítulo.




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