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Mostrando postagens de junho, 2018

Bicicletinha, de Bruno Flores

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Usando um cortador de unha, Dudu repartia em quatro o minúsculo papel verde, leve como confete e que supostamente nos levaria para outra dimensão. João veio do banheiro fechando a braguilha com o copo de cerveja entre os dentes, e Dudu pediu bruscamente que ele fechasse a janela. Qualquer lufada de vento poderia levar embora a fonte da nossa alegria naquela noite: o famoso bicicletinha, em uma poderosa edição especial. ---- Cês tão ligados por que o nome “bicicletinha”? Na mesma hora a Carol revirou os olhos e se levantou do sofá para fazer uma caipirinha, como quem já ouvira aquela história inúmeras vezes. Dudu era assim. Adorava pagar de didático quando tava doidão. Começou a contar sobre o químico suíço Dustin Hofmann, o primeiro cara a... ---- Peraí peraí! Dustin Hoffman é um ator americano! Uma rápida busca no Google revelou que o nome real do cientista era Albert Hofmann, o criador do LSD. Havia sintetizado a droga pela primeira vez em 1938, mas foi cinco anos depois q

Testo Junkie, por Paul Preciado

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Este livro (...) é um protocolo de autotestes com testosterona em gel, exercícios de envenamento controlado em meu próprio corpo. Infecto-me com um significante químico culturalmente marcado como masculino. Vacinar-se de testosterona pode ser uma técnica de resistência para os corpos com os quais fomos designados como mulheres cis. Adquiri certa imunidade política de gênero, tomar um porre de masculinidade, saber que é possível vir a ser do gênero dominante. "Pouco a pouco, a administração de testosterona deixou de ser um simples teste política e se transformou em uma disciplina, um ascetismo, um modo de ressuscitar meu espírito através do pelo que cresce nos meus braços, um vício, uma forma de gratificação, uma fuga, uma prisão, um paraíso. "Os hormônios são próteses químicas. Drogas políticas. Neste caso, a substância não só modifica o filtro com que decodificamos e recodificamos o mundo: também modifica radicalmente o corpo e, portanto, o modo pelo qual somos decodifi

No Cassino do Senhor, de João Bastos de Mattos

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Tinha sido um encontro tão sem pretensões que ele nem sabia dizer como é que depois virou tudo aquilo. Marilda romântica não-me-toques, não sei se minha mãe vai deixar, e depois o cinema e depois a discoteca, a mão que não podia ultrapassar certos limites e aquele jogo duro e a mãe: criei minha filha para ser feliz no casamento e o pai: mas você vai ter condições de assegurar a felicidade de minha filha. Tudo já era passado e agora os dois na alegria e na tristeza, o apartamento de dois quartos no Cachambi e o emprego dele como técnico de manutenção de geladeiras e ela digitadora num bureau de informática e a velha cuidando do neném e Marilda reclamando minha mãe está deseducando a criança e mal dava para ir ao cinema os dois juntos mas o churrasco na casa do sogro era de lei e a santa cervejinha garantida nos fins de semana. Não, não foi bem assim. Eu me confundo. Refaço a história. Ela é que se insinuou e ele nem fazia tanta força mas afinal era cômodo e podia sair alguma coisa i