A solidão é nua - Andréa Rodrigues
A solidão é nua
Ana
queria almoçar fora naquele sábado. Pensou em escrever para algumas amigas, em
busca de companhia. Depois lembrou que
Cristina ia sair com o ex-namorado, Joana devia estar de ressaca, e Letícia...,
ah Letícia estava muito chata ultimamente.
Ana
chegou a pensar em desistir. Olhou para a sua estante, bem desarrumada. O
armário, precisando de uma boa organizada. Mas o sábado a chamava para a rua.
Ana
foi. Foi sozinha. Comprou livro, cumprimentou autor que não conhecia, tentou
puxar conversa com alguns. Sábado era dia de feijoada. Muita gente na rua do
Ouvidor, mas como sentar ali sozinha e pedir uma feijoada? Decididamente,
feijoada não era um prato para se comer sozinha.
Rumou
para um lugar mais tranquilo, pediria uma salada, havia ali perto um
restaurante, ia rolar uma roda de choro.
- São quantas pessoas?
- Só
eu mesma.
Ana
tentava se manter firme na sua proposta. Não tinha companhia e queria fazer
coisas, viver a cidade, os eventos.
A
música demorou para começar. Ana
resolveu fazer um check-in no Facebook, onde surgiu de cara a pergunta: com
quem você está? Ela não podia
simplesmente estar ali, precisava ter sempre um “com não sei quem”?
Como
ela tinha ido parar sozinha no centro num sábado à tarde? Havia algumas
respostas.
Mas
ela pensou em se fazer outras perguntas:
Por
que ela estava ali, mesmo sozinha? Porque estava com vontade, a música começou,
era boa, a comida também. Seria um programa perfeito, não tivesse ali na frente
dela uma cadeira vazia.
E se
tivesse alguém naquela cadeira, como seria? Bem, talvez a pessoa estivesse
gostando tanto quanto ela, e seria divertido. Mas a pessoa também poderia estar
detestando, ali quase por obrigação. Ou talvez a pessoa se estressasse com a
demora da música e do atendimento – o que definitivamente não atingia Ana
naquela tarde.
Ela
começou a achar que todos a olhavam. Deviam imaginar que Ana era intragável,
para ter de almoçar sozinha no sábado.
Ninguém
ali deveria estar pensando que ela estava ali também por escolha. Enjoou das
amigas. Não quis chamar o ex-namorado depressivo que só sabe fazer contas.
Mas
estar ali sozinha era se expor. E Ana foi se sentindo cada vez mais exposta.
As
pessoas iam juntando mesas, falando cada vez mais alto, rindo, dançando. E a
solidão de Ana deveria estar cada vez mais gritante, ela não tirava isso da
cabeça.
O
público pedia bis, mas Ana rapidamente pagou a conta e saiu. No taxi, Ana pediu
que o motorista desligasse o ar. Esfriou muito nesse fim de tarde.
A
solidão é nua.
Conto
escrito para o encontro de 01/ 09/ 2015
Andréa Rodrigues é professora de Prática de Ensino de Língua e
Literatura na UERJ e frequenta o clube da leitura desde abril de 2013.
Comentários
Postar um comentário