Meridiano Celeste & Bestiário - Marco Lucchesi




Recomendação de leitura por Vivian Pizzinga 

 Marco Lucchesi: essa fera cercada de palavras



Hoje venho tratar e indicar poesia da melhor qualidade. O nome é Marco Lucchesi e seu belíssimo livro Meridiano Celeste & Bestiário, que merece a cabeceira da cama, a bolsa no trajeto de metrô, o lugarzinho entre as meias e sapatos na mala de viagem, as horas nubladas e ensolaradas. Merece todo espaço subjetivo de que dispomos, esse que não é um livro fácil de encontrar em livrarias mas que, pasmem!, no Sebo Baratos da Ribeiro eu vi, há alguns meses, na seção de poesia, a castos cinco reais (o último que procurar é mulher do padre!).
O livro saiu pela Editora Record em 2006 e, do início ao fim, é enlevo, delícia e emoção – a linguagem constrói e desconstrói imagens mentais das mais belas, o absurdo de figuras criadas retorce a lógica comum, o intertexto está presente sem operar hermetismos impossíveis de atravessar. Meridiano Celeste & Bestiário não é um livro para ser consumido e esquecido. Não é para ser consumido e lembrado. É um livro que merece continuidade dentro de cada leitor. E tive a sorte de ser apresentada ao livro (e ao autor) pela minha cara amiga literata Ana Ribeiro, que me viu tão apaixonada pelo texto que me deu seu tesouro e ficou sem o dela, em junho de 2013.
Marco Lucchesi é mais que poeta. É romancista, ensaísta, membro da Academia Brasileira de Letras desde 2011, professor da UFRJ, ganhou diversos prêmios e recentemente foi entrevistado pelo Edney Silvestre, por seu último romance, O Bibliotecário do Imperador, de 2013.
O livro que ora indico é composto de dois: Meridiano Celeste (com o subtítulo “A melodia das romas que se gastam”) e Bestiário (“O poeta é uma fera cercada de palavras”). Marco Lucchesi é essa fera que não se contém e usa as palavras a seu favor, a nosso favor, pro nosso bem. Vejamos trechinho do primeiro poema de Meridiano Celeste, que se inicia com um tapa de beleza pura:
“Bem sei que as partes
            que me cercam
            não me atendem
que me debato
            num exílio
            de fontes e cuidados (...).”
O segundo poema de Meridiano Celeste me mata um pouco sempre que leio – me mata por excesso de vida e estética (e eu o selecionei para o projeto Paginário #3, do Leonardo Villa-Forte):
“A minha escuridão
tem fome das andorinhas
            que cruzam
o céu
            indevassável de seu corpo”
Já o segundo livro, Bestiário, é um passeio poético sobre as feras cercadas de palavras e repletas de instintos. Para os que amam felinos, excerto do pequeno poema:
“Gato
    lambe
            com os olhos
  lânguidos
as províncias
do sono (...)”.
Segundo o belo prefácio de Letícia Malard, “o figurino lucchesiano renega o fácil e burila o difícil sem cair na quadratura do círculo nem na fantasmagoria melindrosa do corte. (...) Estilo de poesia que dialoga com o corpo e o gesto das deusas e deusas desfilantes e suas vestes maravilhosas: corpo, gesto e vestes especialmente criados para encanto e espanto de todos nós. E criados divinamente, por um gênio do desenho e da tesoura”.
O meridiano celeste de Marco Lucchesi é para ter sempre perto, como um remédio para a alma nos momentos trevosos.

Comentários

  1. linda dica, e ótima tapeçaria de afetos-considerações. Vou ler! beijo.

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  2. Dá uma passada na seção de poesia da Baratos da Ribeiro. Talvez ainda tenha pra vender!

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