O Insaciável homem-aranha - Vinicius Varela
Recomendação de livro por
Vinicius Varela
Pedro Juan Gutiérrez: “El Prometeo sexual”
Foi
assim que Roberto Bolaño (contemporâneo seu, embora este último seja Chileno)
chamou o cubano, já prevendo o sucesso do trabalho de Pedro. O apelido não
poderia descrevê-lo melhor. Com uma voz narrativa cortante, uma mistura da
rebeldia beatnik com a sexualidade de um Marques de Sade, o autor faz os seus
leitores perceberam logo que há algo de diferente no que ele tem a dizer. Em “O
Insaciável homem-aranha”, o narrador e personagem da história nos guia os
passos por uma Havana decadente, libidinosa, suja, um lugar com regras próprias
onde nada do que valeria no mundo exterior parece se aplicar. Por sua audácia,
o autor ainda é inédito em Cuba. Seus livros não circulam no país. Conseguiu
publicar seus livros pela editora Anagrama, uma das mais prestigiadas editoras
da Espanha e reconhecida nos países hispânicos. Sua prosa é dura e a suas
histórias tem muito que revelar. A realidade de Cuba completamente devassada
nas palavras do escritor choca e ao mesmo tempo envolvem. Ele mesmo consegue se
ver livre de seu fascínio por essa Havana que exala loucura e descontrole.
Entrevistados, disse que só sai de Havana morto ou expulso, que é ali que
precisa estar para encontrar a sua matéria prima. Em um trecho do livro vemos a
angústia que permeia os habitantes da capital cubana: “Olho pela janela. Está tudo pior que ontem,
mas, por tradição e conveniência, não se diz isso. O correto seria: ‘olho pela
janela. Tudo bem’ “. Um submundo onde o sexo e o rum servem de válvula de
escape e mantém, mesmo que momentaneamente, a normalidade de um lugar que está
prestes a explodir. A impressão que temos é de que é impossível viver ali, em
Cuba, um lugar completamente inabitável: “Tento esquecer que tem sempre alguém
controlando, opinando, decidindo nossas vidas. Não é bom lembrar disso porque o
tigre que eu tenho dentro de mim fica furioso. E isso é terrível. Posso ficar
vingativo e selvagem. Posso perder o controle. E na selva quem perde o controle
perece. Nada de perder o controle. Tem que ser astuto.”
Há
um permanente clima de tensão que faz as histórias pulsarem. O cubano cria uma
atmosfera que proporciona uma verdadeira overdose de realidade. Não há descanso
para o leitor. “O Insaciável homem-aranha” é um livro contos onde um personagem
protagoniza todas as histórias, constituindo assim um romance composto por
contos. O livro foi um verdadeiro presente. Me foi dado por um amigo (Filipe
Ralha), comprado no Sebo Baratos da Ribeiro. Me impressionei. Aquelas palavras
ficaram na minha cabeça e ainda hoje voltam. A coragem de ficcionalizar a
própria vida demonstrada por Juan é admirável. Conta a si mesmo com uma
brutalidade que machuca, mas não a ele, que aguenta firmemente cada palavra,
senão ao leitor. Vida e obra se confundem permanentemente: “Julia quer que eu
escreva coisas alegres e bonitas. E minha verdadeira vocação é me meter nas
cloacas, pegar ratos e abrir a barriga deles com um facão para ver o que tem
dentro”, diz o personagem. Não bastasse
tudo isso. O livro é imperdível pela maneira tão contemporânea que Gutierrez
tem de narrar. Sua fluidez é incrível, fazendo a história leve, na medida do
possível. Não se engane. Quem ler esse cubano não sairá ileso.
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