A regra - Daniel Russell Ribas



A regra


Ela sempre foi clara e inviolável. Nunca mijar fora do vaso. “Isto é nojento!”, esbravejava. Então, com toda boa vontade, mirava na água. Ainda assim, acidentes ocorriam. E a quantidade não importava. Apenas uma gota era o necessário para a tempestade vir. “Porra! Tenho cara de doméstica? Gosto da casa limpa, tudo arrumado no seu lugar, aí você chega e emporcalha tudo!” A porrada comia, esta parecia ser a regra real.

Tudo no seu lugar, bem ajustado: gota fora, cacete adentro. 

Anos e a regra, que não era dita, era tão clara quanto aquele xixi depois de beber muita água.

Uma noite, cheguei bêbado. Tava puto e tomei todas. Da branquinha, desceu bem e queimando. “Porra, tá fedendo a cachaça!”, escutava na cabeça num contínuo monótono e agudo.

Encarei a privada e saquei minha pistola, como um caubói de faroeste italiano. E girei o bicho em alta velocidade. Mijei a porra do banheiro todo. Gargalhei alto, como um cientista louco. Ela chegou à porta, de boca aberta. Olhei fundo e sério. Declarei:

- Agora, a regra não é clara. É amarela!


Conto escrito para o encontro de 19/01/2016


 

Daniel Russell Ribas é membro do coletivo “Clube da Leitura” (http://clubedaleiturarj.blogspot.com.br), que organiza evento quinzenal no Rio de Janeiro. Organizou as coletâneas “Para Copacabana, com amor” (Ed. Oito e meio), “A polêmica vida do amor” e “É assim que o mundo acaba”, ambos em parceira com Flávia Iriarte e publicados pela Oito e meio, e “Monstros Gigantes – Kaijus”, em parceria com Luiz Felipe Vasquez, pela Editora Draco. Participou como autor dos livros “Clube da Leitura: modo de usar, vol. 1”, “Lama, antologia 1” (publicação independente), “Clube da Leitura, volume II”, “Sinistro! 3”, “Ponto G” (Multifoco), “Caneta, Lente & Pincel” (Ed. Flaneur), “Clube da Leitura, vol. III”, “Veredas: panorama do conto contemporâneo brasileiro” e “Encontros na Estação” (Oito e meio). Publica crônicas quinzenalmente na revista “Rubem” (https://rubem.wordpress.com). 

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