Um sinal no espaço (As Cosmicômicas), por Italo Calvino
Situado na zona
externa da Via Láctea, o Sol leva cerca de duzentos anos para realizar uma
revolução completa da Galáxia.
Exatamente, este é o tempo que
leva, nada menos, disse Qfwfq; eu uma
vez passando fiz um sinal no espaço, de propósito, para poder vir reencontrá-lo
duzentos milhões de anos depois, quando viéssemos a passar por ali na volta
seguinte. Um sinal como? É difícil dizer porque quando lhes digo sinal pensarão
imediatamente em alguma coisa que se distinga de outra coisa, e ali não havia
nada que pudesse se distinguir-se de nada; pensarão logo num sinal marcado com
um utensílio qualquer ou mesmo com as mãos; em seguida, que os utensílios e as
mãos se vão mas que o sinal permanece; mas naquele tempo ainda não havia
utensílios, nem mesmo as mãos, ou dentes, ou narizes, tudo isso que veio em
seguida, mas muito tempo depois. Quanto à forma que se dá ao sinal, acharão não
ser problema porque, seja qual for a forma que tenha, basta que um sinal sirva
de sinal, quer dizer, que seja diverso ou mesmo igual aos outros sinais: também
aqui estarão a falar depressa demais porque naquela época não havia exemplos
aos quais referir-me para saber se o fazia igual ou diverso de outro, não havia
coisas que se pudessem copiar, nem mesmo uma linha reta ou curva que fosse, não
se sabia o que era, nem um ponto, uma saliência ou uma reentrância. Tinha a
intenção de considerar sinal uma coisa qualquer que me ocorresse fazer, donde
tendo eu, naquele ponto do espaço e não em outro, feito algo com a intenção de
fazer um sinal, resultou em verdade que acabei fazendo um sinal.
CALVINO, Italo. As
Cosmicômicas. São Paulo: Companhia das Letras, 1999.
(Mote lido por Guilherme Preger para o encontro de 17/09/2019).
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