Mote do encontro (05/ 03/ 16)
Mote lido por Walter Macedo Filho
Possibilidades da inteligência
Uma
inteligência que reflete é uma inteligência que, afora o esforço praticamente
útil, possuía um excedente de força para gastar. É uma consciência que,
virtualmente, já se reconquistou a si mesma. Mas ainda é preciso que a
virtualidade passe ao ato. É de presumir que, sem a linguagem, a inteligência
teria ficado atada aos objetos materiais que tinha interesse em considerar.
Teria vivido num estado de sonambulismo, exteriormente a si mesma, hipnotizada
por seu trabalho. A linguagem contribuiu muito para libertá-la. A palavra,
feita para ir de uma coisa para outra, é, com efeito, essencialmente deslocável
e livre. Poderá, portanto, estender-se, não só de uma coisa percebida a outra
coisa percebida, mas também da coisa percebida à lembrança dessa coisa, da lembrança
precisa a uma imagem mais fugidia, de uma imagem fugidia, mas no entanto ainda
representada, à representação do ato pelo qual é representada, ou seja, à
ideia. Abrir-se-á, assim, aos olhos da inteligência que olhava para fora, todo
um mundo interior, o espetáculo de suas próprias operações. Ela, aliás, estava
só esperando essa oportunidade. Aproveita-se do fato de que a palavra é ela
mesma uma coisa para penetrar, levada pela palavra, no interior de seu próprio
trabalho. Por mais que seu primeiro ofício fosse fabricar instrumentos, essa
fabricação só é possível pelo emprego de certos meios que não estão talhados na
medida exata de seu objeto, que o ultrapassam e que, dessa forma, permitem à
inteligência um trabalho suplementar, isto é, desinteressado. A partir do dia
em que a inteligência, refletindo sobre seus procedimentos, percebe-se a si
mesma como criadora de ideias, como faculdade de representação em geral, não há
mais objeto do qual não queira ter a ideia, mesmo que este não tenha relação
direta com a ação prática. Eis por que dizíamos que existem coisas que só a
inteligência pode procurar. Com efeito, só ela se preocupa com teoria. E sua
teoria gostaria de abarcar tudo, não só a matéria bruta, sobre a qual tem naturalmente domínio, mas também a vida e o
pensamento.
Bergson, Henri. Memória
e Vida (textos escolhidos).
São Paulo: Martins Fontes, 2006.
O
filósofo Henri Bergson defendeu ideias fundamentais para o
desenvolvimento da filosofia moderna, as quais são amplamente absorvidas por
todos, assumindo assim um caráter popular sem precedentes, quando Bergson ainda
se encontrava vivo. Ele sobrepõe seu ponto de vista biológico à tradicional
concepção materialista da Ciência e da Metafísica, encerrando desta forma o
reinado da visão de Descartes. O desejo de Bergson é inserir nas esferas das
Ciências Humanas e da Religião os elementos positivistas, utilizando para isso
uma ferramenta essencial, a evolução. Ele defende que a realidade vivenciada
pelo Homem é a duração real, a qual se desenrola na consciência, neste cenário
em que se conectam a experiência e a intuição, esta representando o núcleo
central da vivência genuína, a ação intensa que define a durabilidade do real.
Bergson defende, assim, quatro conceitos básicos, a ‘intuição’, a ‘durée’, a
memória e o élan vital, aqui descritos sucintamente.
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