Mote do encontro 11/11
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Meu
pai leva-me à porta do famoso noturno para a cidade grande:
-
Cuide-se, meu filho. É um mundo selvagem.
Esse
verbo clamante no teu ouvido. Por delicadeza, perdi a minha voz. Ó profetas ó
sermões!
-
Longe da família, será você contra todos.
Homem
não se beija nem abraça, nos apertamos duramente as mãos. Me instalo a uma das
janelas, com a vidraça descida. Mais que me esforce, impossível erguê-la. Já
não podemos falar. Esse pai dos pais ali na plataforma, mudo e solene. O trem
não parte. Fumaça da estação? De repente ei-lo de olhos marejados.
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De
repente ei-lo de olhos marejados. E, sem querer, também eu comovido. Diante de
mim o feroz tirano da família? Ditador da verdade, dono da palavra final?
Primeira vez, em tantos anos, vejo um senhor muito antigo. Pobre velhinho
solitário. Merda, o trem não parte. Meu pai saca o relógio do colete, dois
giros na corda. Pressuroso, digo que se vá. Doente, não apanhe friagem. E ele
sem escutar.
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E
ele sem escutar. Olha de novo o relógio. Aceno que pode ir, não espere a
partida. Quer ver a hora? Exibe o patacão na ponta da corrente dourada. Nosso
último encontro, sei lá. E, ainda na despedida, o eterno equívoco entre nós.
Maldita vidraça de silêncio a nos separar. Desta vez para sempre.
TREVISAN,
Dalton. 234. Rio de Janeiro: Record, 1997
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